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Compra e Venda de Coisa Imóvel Defeituosa
Quando a venda do imóvel é efectuada pelo construtor (ou empreiteiro), isto é, quan-do o vendedor do imóvel é quem o tenha construído, modificado ou reparado, aplicam-se as disposições do contrato de empreitada, cfr. n.º 4 do artigo 1225.º do Códi-go Civil. Com efeito, segundo o disposto no n.º 1 do artigo 1225º do Código Civil, as empreitadas de construção, modificação ou reparação de edifícios (ou outros imóveis) destinados a longa duração, estão sujeitas a um prazo de garantia de 5 anos, sem prejuízo de prazo mais longo que resulte de convenção das partes.

Assim, se no decurso de 5 anos a contar da entrega, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação ou por erros na execução dos trabalhos, a obra apresentar defeitos, são reconhecidos ao dono da obra ou ao terceiro adquirente, os seguintes direitos:

i) o direito à eliminação dos defeitos ou a nova construção se os defeitos não puderem ser eliminados (cfr. artigo 1221.º do Código Civil), ou a redução do preço ou resolução do contrato (cfr. artigo 1222.º do mesmo Código) se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina. Nos termos da regra da caducidade destes direitos em sede de empreitada, os mesmos têm de ser exercidos dentro do prazo de 1 ano a contar da aceitação da obra (ou da aceitação com reservas) ou dentro do ano contado desde a denúncia dos defeitos que fossem desconhecidos à data da aceitação da obra mas, em caso algum, depois de decorridos 2 anos sobre a entrega da obra;
e

ii) O direito de exigir do empreiteiro a indemnização pelos prejuízos, nos termos gerais (cfr. artigo 1223.º do Código Civil) (v.g. pela afectação das condições normais de habitabilidade, sendo os proprietários impedidos de retirarem do imóvel onde habitam todas as comodidades que um lar deve oferecer).
Para tanto e em qualquer dos casos, deve a denúncia dos defeitos ser feita - prefe-rencialmente, por carta registada com aviso de recepção - dentro do prazo de 1 ano seguinte ao conhecimento do defeito e desde que dentro do referido prazo da garan-tia de 5 anos que se iniciou com a entrega do imóvel. É de todo aconselhável que na referida denúncia se fixe um prazo razoável para a remoção dos defeitos.

Se apesar de devidamente interpelado, o empreiteiro nada fizer, o proprietário deve intentar a acção de pedido de eliminação de defeitos e/ou de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, no prazo máximo de 1 ano após a data da denúncia dos defeitos, sob pena de caducidade do direito (n.ºs 2 e 3 do art.º 1225.º do Código Civil), porquanto «a nossa lei [não confere] parece não conferir ao dono da obra o direito de, por si ou através de terceiro, eliminar os defeitos à custa do empreiteiro, mas tão só o de obter a condenação prévia deste e, depois, em sede executiva, exigir que o facto seja prestado por terceiro à custa do empreiteiro», cfr. Acórdão da Relação de Coimbra, de 10 de Dezembro de 1996, publicado na RLJ, ano 131º, pág.113, anotado por Henrique Mesquita, citado no Acórdão do STJ de 04/12/2007, processo n.º 06B4505, disponível em www.dgsi.pt.

Obtida a sentença de condenação, se o empreiteiro persistir no incumprimento, o proprietário deve requerer a execução específica da prestação de facto, se a mesma for fungível. Exceptuam-se, no entanto, da obrigatoriedade de obtenção de prévia condenação do empreiteiro, os casos em que exista manifesto estado de necessida-de de remoção dos defeitos (v. infra a alínea a)).

A divergência, quanto a prazos, entre a compra e venda de imóvel em que o vendedor do mesmo foi quem o construiu, modificou ou reparou e uma usual compra e venda a outrem que não aquele, situa-se apenas no prazo para a propositura da acção judicial: como vimos, no primeiro caso, terá de ser intentada no prazo de um ano pos-terior à denúncia, enquanto que, no segundo caso, o prazo para o efeito é de seis meses (cfr. artigo 917.° do Código Civil).

O exercício dos direitos pelo dono da obra ou pelo terceiro adquirente (com efeito, a responsabilidade do empreiteiro estende-se a quem adquirir do dono original da obra o prédio ou fracções, bem como existe independentemente do número de alienações do imóvel defeituoso, continuando o empreiteiro a responder sempre perante o último adquirente, dentro do prazo de 5 anos após a entrega da obra ao seu primitivo dono, dado que o prazo não se renova após cada transmissão de propriedade. No entanto, ao terceiro adquirente apenas ficam reservados os direitos de eliminação do defeitos, realização de nova obra e indemnização. Neste sentido, v. o Acórdão da Relação do Porto, de 24/05/2007, processo n.º 0732332, disponível em www.dgsi.pt e CURA MARIANO [in Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Almedina, 2ª ed., 2005, págs.184] aí citado), em caso de venda de coisa imóvel defeituosa, pode traduzir-se, esquematicamente, da seguinte forma:

 VER ESQUEMA

Vejamos ainda alguma jurisprudência sobre questões mais específicas deste regime.

a. Direito do empreiteiro/vendedor a eliminar o defeito da obra

Cfr. excerto do Acórdão do STJ de 04/12/2007, processo n.º 06B4505, disponível em www.dgsi.pt:

“Mas quando e até quando o direito de eliminar defeitos antes que o comprador tenha o direito aos mais direitos que a lei lhe confere, seja a redução do preço, seja a resolução do contrato, seja a eliminação dos defeitos pelo próprio comprador, ou a seu mando, a expensas do empreiteiro/vendedor?

Se bem pensamos enquanto ele, empreiteiro/vendedor, perante a denúncia dos defeitos pelo comprador, se propuser agir em tempo útil nessa eliminação.

Em tempo útil e por modo útil. Ou seja, de modo repor a obra na qualidade que originalmente devia apresentar.
O que o comprador não tem é o direito de por si próprio, por sua iniciativa, corrigir os defeitos que entende existirem sem antes dar ao empreiteiro/vendedor a possibilida-de, o direito dessa eliminação.

Dizem os autores e diz a jurisprudência que « a nossa lei [não confere] parece não conferir ao dono da obra o direito de, por si ou através de terceiro, eliminar os defeitos à custa do empreiteiro, mas tão só o de obter a condenação prévia deste e, depois, em sede executiva, exigir que o facto seja prestado por terceiro à custa do empreiteiro » - do acórdão da RC de 10 de Dezembro de 1996, publicado na RLJ, ano 131º, pág.113, anotado por Henrique Mesquita.

Escreve Pedro Romano Martinez, Contrato de Empreitada, Almedina, 1994, pág.206 - « perante a recusa do empreiteiro, pode o dono da obra requerer a execução específica da prestação de facto, nos termos do art.828º do CCivil, se ela for fungível ».

Assim se salvaguarda o direito que é um direito - passe o pleonasmo - do empreiteiro à eliminação dos defeitos.
O dono da obra não pode por si proceder à reparação, sem dar primeiro ao emprei-teiro o conhecimento dos defeitos e a oportunidade de os eliminar. E perante a recusa deste, seguirá o processo da execução específica previsto na lei sem o que estaríamos a legitimar «uma forma de auto-tutela não consentida na lei».

Mas até quando? Colocado o empreiteiro perante a existência de defeitos na obra e a necessidade de os corrigir, até quando esperar por ele?

Não seguramente até um momento em que a eliminação seja já inútil ou em que o decurso do tempo vá tornando progressivamente a obra inadequada aos fins a que se destinava.

Não pode o empreiteiro beneficiar do seu direito à eliminação dos defeitos por forma a postergar o direito do dono da obra à sua perfeição.

De modo que há situações em que se não pode deixar correr o longo tempo do processo do art.828ºdo CCivil porque o tempo deteriora significativamente o direito do dono da obra.

É por isso que a doutrina e a jurisprudência não podem deixar de dizer também:

O direito à eliminação dos defeitos por parte do empreiteiro/vendedor, e mesmo a exigência de condenação judicial prévia deste e da subsequente execução específica por parte do dono da obra, cedem perante uma situação de urgência ou estado de necessidade à qual aquele não ocorra, podendo em tal caso o dono da obra realizar por si ou alguém a seu mando essa eliminação, à custa do empreiteiro.

É o que dizem Pedro Romano Martinez, Cumprimento defeituoso, Colecção Teses, Almedina, 1994, pág.389 - « em casos de manifesta urgência, e para evitar maiores prejuízos, é admissível que o credor, directamente e sem intervenção do poder judicial, proceda à eliminação dos defeitos, exigindo depois as respectivas despesas. Esta ilação tem por base a princípio do estado de necessidade ( art.339º do CCivil ) ». E Pires de Lima / Antunes Varela, em anotação ao art.1221º no volume II do seu CCivil Anotado.”

b. Persistência dos defeitos após intervenção do empreiteiro. Contagem do prazo de caducidade.

Cfr. excerto do Acórdão do STJ de 08/11/2007, processo n.º 07B2976, disponível em www.dgsi.pt:

“O dec-lei 267/94, de 25 Outubro, que deu nova redacção aos citados arts. 916º e 1225º, veio estender o campo de aplicação do regime de empreitada ao vendedor que tenha sido simultaneamente construtor do prédio vendido e uniformizar os prazos de denúncia dos defeitos e subsequente direito de acção nas situações de empreitada e venda de coisa defeituosa.
E resolveu os diferentes entendimentos que a nível jurisprudencial conflituavam quanto a saber se o art. 1225º só regulava as relações entre empreiteiro e dono da obra ou se também abarcava as situações em que o vendedor tivesse sido o construtor, consagrando este último entendimento (2).

Com esta alteração, tornou-se seguro que o empreiteiro é responsável pelos defeitos que a obra apresente não só perante o dono da obra, como também perante o terceiro que lha adquiriu, podendo este socorrer-se do regime da empreitada para o responsabilizar por esses defeitos.

Quando o vendedor do prédio tenha sido o seu construtor, não obstante inexistir empreitada entre ele e o comprador, aos defeitos do prédio é aplicável o regime do art. 1225º e não o do art. 916º (3) .

Segundo este regime, tal como o estabelecido pelo nº 3 do art. 916º, quando a coisa vendida seja um imóvel, a denúncia será feita dentro do prazo de um ano após conhecidos os defeitos e dentro de cinco anos a contar da entrega do imóvel.

O não cumprimento de denúncia tempestiva dos defeitos, ónus que recai sobre o vendedor/réu em conformidade com o disposto no nº 2 do art.343º C.Civil, acarreta a caducidade dos direitos conferidos ao comprador –art. 1224º C.Civil, fazendo a lei corresponder à denúncia o reconhecimento, por parte do empreiteiro, da existência do defeito –nº 2 do art. 1220º C.Civil.

Sustentam os recorrentes ter-se operado a caducidade do direito de acção por esta ter sido instaurada após o decurso do prazo de cinco anos sobre a entrega do imóvel.

Segundo os nºs 1, 2 e 3 do art. 1225º C.Civil, o prazo de garantia e o direito à eliminação dos defeitos é de cinco anos, devendo a respectiva denúncia ser feita no prazo de um ano.

Descobertos os defeitos, a sua denúncia deve ser feita dentro do ano subsequente e a acção instaurada igualmente dentro de uma ano a contar dessa denúncia, sob pena de caducidade.

O que está em causa na situação em análise é, porém, a deficiente reparação levada a cabo pelos réus de defeitos que eles reconheceram existir no edifício.

Os autores denunciaram a existência de determinadas deficiências em partes comuns do edifício e os réus reconheceram a sua existência, tendo procedido à sua reparação no Verão de 1998.

Acontece, porém, que algumas dessas deficiências não foram solucionadas, reaparecendo ao longo do Inverno de 2002/2003, logo comunicadas, em Janeiro de 2003, aos réus.

Daqui decorre que os réus reconheceram a existência de defeitos no edifício. E tanto assim que se propuseram eliminá-los, só que não o conseguiram totalmente, persistin-do alguns desses defeitos.

Ora, dispõe-se no art. 328º C.Civil que o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine.

Para no nº 1 do art. 331º se dizer que só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.

Quando, porém, se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, preconiza o nº 2, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deve ser exercido.

A caducidade pode, pois, ser impedida, mas não interrompida ou suspensa.

Como afirma Aníbal de Castro (4) o impedimento corresponde à efectivação do direi-to, não gera novo prazo, ficando o direito definido sujeito às disposições que regem a prescrição. Ou antes, esgotando-se ou exaurindo-se, com o exercício, o direito caducável, o que porventura surgir, em consequência desse exercício, ficará sujeito, não ao regime anterior, mas àquele a que houver mister recorrer-se, se for caso disso.

O impedimento da caducidade, como se escreveu no ac. S.T.J., de 1998/11/25 (5) , não tem como efeito o início de novo prazo, mas o seu afastamento definitivo.

Só assim não será se a lei sujeitar o exercício do direito a novo prazo de caducidade, situação que ocorre precisamente no caso do art. 1225º.

Os autores denunciaram, em tempo, a existência dos defeitos que o edifício ostentava nas partes comuns e os réus propuseram-se repará-los, obrando nesse sentido.

Estamos indubitavelmente no campo de direitos disponíveis. Por isso, o claro reconhecimento, por parte dos réus, da existência de defeitos, impediu a caducidade, afastando-a.

Posteriormente e porque alguns desses defeitos não tivessem sido eficientemente reparados, imediatamente os autores os denunciaram. E perante a falta de resposta dos réus, instauraram, cerca de quatro meses após essa denúncia, a presente acção.

Reconhecendo o construtor/vendedor do imóvel a existência de defeitos, que reparou deficientemente, o exercício do direito conferido ao dono da obra em vista da sua eliminação fica sujeito a novo prazo de caducidade.

Daí que tenham sido respeitados os prazos de denúncia dos defeitos e de instauração da respectiva acção, sendo, por isso, tempestivo o exercício dos direitos conferidos aos autores.

(2) cfr, neste sentido, acrs. S.T.J., de 1996/06/27 e de 2004/07/06, in B.M.J., 458º-315 e www.dgsi.pt/jstj, respectivamente
(3) neste mesmo sentido se pronunciou Calvão da Silva, in Compra e Venda de Coisas Defeituosas, pág. 100
(4) in A Caducidade na Doutrina, na Lei e na Jurisprudência, pág. 145
(5) in B.M.J., 481º-430”.