A recente Lei n.º 38-A/2023, motivada pela Jornada Mundial da Juventude, instituiu um regime de amnistia e perdão de penas para ilícitos penais de menor gravidade praticados até 19 de junho de 2023. Contudo, a limitação deste regime a indivíduos com idades entre os 16 e os 30 anos gerou um intenso debate jurídico e social, levantando questões sobre a sua constitucionalidade e a conformidade com o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Em análise publicada pelo advogado António Jaime Martins, o tema ganha uma abordagem crítica e fundamentada. O autor coloca em evidência a incoerência da restrição etária, considerando-a desprovida de uma justificação objetiva e razoável, essencial para garantir a legitimidade de uma diferenciação legislativa.
O Princípio da Igualdade e a Limitação Etária
O artigo 13.º da CRP garante que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, proibindo privilégios ou prejuízos baseados em fatores como sexo, raça ou ascendência. Embora a idade não seja expressamente mencionada, a exclusão de cidadãos com mais de 30 anos do regime de amnistia levanta dúvidas quanto à constitucionalidade da medida.
Conforme destacado pelo Dr. António Jaime Martins, todos os cidadãos condenados por ilícitos penais praticados até 19 de junho de 2023 encontram-se em situações juridicamente comparáveis. A diferenciação etária, por conseguinte, só seria admissível caso estivesse alinhada com critérios de adequação, necessidade e proporcionalidade para alcançar um objetivo legítimo.
Finalidades Declaradas da Lei: Uma Aplicação Restrita
Entre os objetivos declarados da Lei n.º 38-A/2023 estão a promoção da reinserção social, a redução da sobrelotação prisional e a comemoração de uma data relevante para o país. No entanto, como sublinha o autor, estas finalidades não são exclusivas de uma faixa etária específica, sendo aplicáveis a todos os condenados, independentemente da idade.
A restrição imposta pelo legislador cria uma barreira artificial, sem base em critérios objetivos que sustentem a exclusão de cidadãos com mais de 30 anos. Para estes, a medida representa uma exclusão injustificável, deixando a impressão de que são menos merecedores de perdão ou menos capazes de se reintegrar na sociedade, um argumento que António Jaime Martins classifica como simplesmente mau demais para ser verdade.
A Decisão do Tribunal Constitucional
O tema chegou ao Tribunal Constitucional, que no Acórdão n.º 471/2024 considerou a diferenciação etária válida e proporcional. Esta decisão, no entanto, gerou surpresa na comunidade jurídica, especialmente pela ausência de fundamentação sólida que justificasse tal exclusão. Para o autor, a decisão, sancionada pela maioria dos juízes conselheiros, é uma ignomínia difícil de explicar aos cidadãos com mais de 30 anos.
Conclusão: Um Debate Necessário
O artigo do Dr. António Jaime Martins apresenta uma reflexão crítica e bem fundamentada sobre a constitucionalidade da Lei n.º 38-A/2023 e as suas implicações. A restrição etária não apenas compromete o princípio da igualdade, mas também desafia a ideia de justiça que deve nortear qualquer medida de reinserção social.
Este debate não é meramente técnico, mas essencial para garantir que as leis sejam construídas com respeito pelos direitos fundamentais de todos os cidadãos. A análise do autor lembra-nos que a igualdade perante a lei não pode ser uma promessa vazia, mas um pilar inalienável do Estado de Direito.
Fonte: António Jaime Martins, advogado.