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Créditos de Compensação: Equidade Patrimonial no Divórcio à Luz da Lei 61/2008

A Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, introduziu importantes alterações no regime de compensação de créditos em sede de partilha de bens conjugais, especialmente em casos de divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges. A sua implementação visou equilibrar a situação patrimonial entre os cônjuges e promover uma compensação mais justa na distribuição dos bens.


 Contexto da Lei 61/2008

A Lei 61/2008 veio reformular o regime do divórcio em Portugal, eliminando a necessidade de culpa para a dissolução do casamento e promovendo uma abordagem baseada na cessação objetiva da relação conjugal. Um dos seus aspetos centrais é a introdução do crédito de compensação em situações onde um dos cônjuges tenha contribuído de forma desproporcionada para os encargos da vida familiar, sem que tal se reflicta de forma proporcional na titularidade dos bens comuns.

 Créditos de Compensação

Os créditos de compensação surgem como um direito de um dos cônjuges a ser compensado por contribuições significativas para o património comum ou para os encargos da vida familiar, que ultrapassem o que seria considerado proporcional. Este direito visa garantir a equidade na partilha dos bens após o divórcio, reconhecendo que, por vezes, um dos cônjuges pode sacrificar a sua capacidade de gerar rendimentos (por exemplo, dedicando-se à vida doméstica ou ao cuidado de filhos) enquanto o outro acumula património.

 Condições para Créditos de Compensação

Nos termos da Lei n.º 61/2008, para que um cônjuge tenha direito ao crédito de compensação, é necessário que se verifiquem as seguintes condições:

1. Contribuição desproporcionada: Um dos cônjuges terá de ter contribuído de forma desproporcional para os encargos familiares ou para a aquisição de bens, seja através de rendimentos ou trabalho não remunerado.

2. Impacto patrimonial: Essa contribuição deve ter favorecido o património comum, ou seja, não se traduz apenas no suporte da vida quotidiana, mas também no incremento de riqueza conjunta, de que ambos os cônjuges deveriam beneficiar.

3. Partilha dos bens: O crédito de compensação deve ser exercido no momento da partilha dos bens comuns, assegurando que, no final do processo de divórcio, ambos os cônjuges recebam uma compensação justa pelo esforço e contribuições feitas durante o casamento.

 Cálculo do Crédito

O valor do crédito de compensação deve refletir o montante da contribuição desproporcional realizada por um dos cônjuges. A lei não define um método de cálculo específico, mas cabe ao tribunal avaliar a equidade do montante com base nos rendimentos de cada cônjuge e nas contribuições efetuadas ao longo da vida conjugal.

 Exemplo Prático

Suponha que, durante o casamento, um dos cônjuges optou por suspender a sua carreira para cuidar dos filhos, enquanto o outro continuou a trabalhar e acumulou bens em seu nome. Ao ocorrer o divórcio, o cônjuge que permaneceu em casa tem direito a um crédito de compensação por ter contribuído, de forma indireta, para a acumulação de riqueza do casal, uma vez que assumiu as responsabilidades domésticas.

 Objetivos da Lei

O principal objetivo da Lei 61/2008 e dos créditos de compensação é garantir a justiça patrimonial entre os cônjuges após o divórcio. Reconhece-se, assim, que contribuições não financeiras, como o trabalho doméstico ou o cuidado dos filhos, têm valor económico, sendo fundamental para assegurar a proteção de um dos cônjuges, evitando que este fique financeiramente vulnerável após a separação.

 Conclusão

A introdução do conceito de crédito de compensação pela Lei 61/2008 foi um marco significativo no direito de família em Portugal. Este mecanismo legal reconhece as diferentes formas de contribuição de ambos os cônjuges e visa garantir uma partilha justa do património adquirido durante o casamento, especialmente quando as contribuições financeiras e não financeiras são desproporcionais.

O crédito de compensação é, portanto, um importante instrumento de equidade e justiça patrimonial, assegurando que nenhum dos cônjuges seja prejudicado financeiramente devido à forma como organizou a vida familiar e laboral durante o casamento.

Referências bibliográficas sobre o tema dos **créditos de compensação** no âmbito da **Lei n.º 61/2008** em Portugal:

1. **Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro**: Altera o regime jurídico do divórcio, modificando disposições do Código Civil relacionadas com o casamento, o divórcio e as consequências patrimoniais, incluindo os créditos de compensação entre cônjuges.

2. **Pereira Coelho, Maria Clara Sottomayor**, *"Divórcio e Responsabilidade Civil entre Cônjuges"*, 2ª edição, Coimbra Editora, 2009: Aborda as alterações introduzidas pela Lei n.º 61/2008, com enfoque nos créditos de compensação e na responsabilidade civil no contexto conjugal.

3. **Oliveira, Guilherme de**, *"Curso de Direito da Família"*, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2017: Obra de referência que analisa profundamente o direito da família, incluindo as implicações dos créditos de compensação após o divórcio.

4. **Leitão, Luís Menezes**, *"Direito da Família e das Sucessões"*, 7ª edição, Almedina, Coimbra, 2019: Explora o regime de bens entre cônjuges e aborda os créditos de compensação no contexto das alterações legislativas.

5. **Silva, Joaquim de Almeida**, *"Os Créditos de Compensação entre Cônjuges: Natureza e Regime Jurídico"*, Revista da Ordem dos Advogados, Ano 70, 2010: Artigo que examina a natureza jurídica dos créditos de compensação e sua aplicação prática após a Lei n.º 61/2008.

6. **Magalhães, José António Dias**, *"O Novo Regime do Divórcio: Alterações ao Código Civil pela Lei n.º 61/2008"* in *Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Oliveira Ascensão*, Coimbra Editora, 2010: Analisa detalhadamente as mudanças legislativas e os impactos nos créditos de compensação.

7. **Sottomayor, Maria Clara**, *"Regulação das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio"*, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2018: Embora focado nas responsabilidades parentais, inclui discussões relevantes sobre as implicações patrimoniais do divórcio e créditos de compensação.

8. **Pires, Rita Lobo Xavier**, *"Divórcio sem Consentimento: Pressupostos e Efeitos"*, Themis - Revista da Faculdade de Direito da UNL, n.º 16, 2009: Artigo que aborda os efeitos do divórcio sem consentimento, incluindo aspetos patrimoniais como os créditos de compensação.

9. **Varela, João de Matos Antunes**, *"Código Civil Anotado"*, Volume IV, 3ª edição, Coimbra Editora, 2010: Comentários aos artigos do Código Civil afetados pela Lei n.º 61/2008, com notas sobre a aplicação prática dos créditos de compensação.