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A relação do seguro obrigatório de acidentes de trabalho com a existência do contrato de trabalho ou contrato de prestação de serviços
Um contributo prático para a análise reflexão da relação do seguro obrigatório de acidentes de trabalho numa relação de contrato de trabalho ou de contrato de prestação de serviços.

A) Contrato de Trabalho/Contrato de Prestação de Serviços

A caracterização da prestação do trabalho por parte de alguém assume uma especial importância dada a diferença de regime legalmente estabelecida. Desde logo, ver-se-á que uma relação laboral, ou seja, a existência de um contrato de trabalho obriga a um sem número de obrigações tais como ao pagamento de subsídio de férias e de Natal, a uma retribuição mínima legalmente estabelecida e a um conjunto muito próprio de regras referentes à cessação dessa mesma relação bem como ao pagamento de indemnizações e compensações,….

São indícios da existência de um contrato de trabalho o facto do prestador realizar o seu trabalho em local controlado pela empresa respeitando um horário predefinido, seja retribuído em função do tempo dispendido, os instrumentos de trabalho sejam essencialmente fornecidos pelo beneficiário da actividade, entre outros.

Assim, o que caracteriza verdadeiramente a relação laboral, ou seja a existência de um contrato de trabalho é o vínculo de subordinação ou dependência jurídica. Quando alguém se obriga a prestar a outrém a sua actividade, sob as ordens, autoridade e direcção deste, encontramo-nos perante a existência de um verdadeiro contrato de trabalho, independentemente do documento assinado.
 
Diferentemente, no contrato de prestação de serviços, o servidor goza de total autonomia técnica, científica e pedagógica na preparação, elaboração e execução da obra, tarefa ou serviço.

Desta forma, presumir-se-á que a actividade é exercida sem subordinação ou dependência jurídica quando o prestador de serviços:
a) Tenha, no exercício da sua actividade, a faculdade de escolher os processos e os meios a utilizar, sendo estes, total ou parcialmente, da sua propriedade;
b) O prestador não se encontre sujeito a horário e ou períodos mínimos de trabalho;
c) O prestador possa subcontratar outros para a execução do seu serviço em sua substituição;
d) A actividade do prestador não se integre na estrutura do processo produtivo, na organização do trabalho ou na cadeia hierárquica da empresa e constitua um elemento acidental nessa mesma organização e no desenvolvimento dos objectivos da entidade beneficiária;

Em suma, pelo acima exposto, verifica-se que os condicionalismos que levam à caracterização da relação laboral (leia-se existência de contrato de trabalho) são extremamente amplos.

B) O Seguro de Acidentes de Trabalho

É através do seguro de acidentes de trabalho, ou seja com a transferência da responsabilidade civil do empregador para uma companhia de seguros que se pretende garantir aos trabalhadores e respectivos familiares, em caso de acidente de trabalho, indemnizações e várias outras prestações.

Ora, a responsabilidade em efectuar o seguro de acidentes de trabalho pertence à entidade empregadora no caso de estarmos perante um contrato de trabalho. Diferentemente, no caso da prestação de serviços, essa responsabilidade é do próprio prestador.

Aliás, constitui contra-ordenação o não cumprimento pelos trabalhadores independentes da obrigação a efectuar um seguro de acidentes de trabalho que garanta o ressarcimento dos danos sofridos, nomeadamente a perda da capacidade de ganho em caso de acidente de trabalho. O processamento da contra-ordenação, bem como a aplicação da correspondente coima, compete ao Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho (IDICT).

A prova da existência do seguro faz-se pela apresentação de documento, a emitir pela empresa de seguros, onde conste a identificação do trabalhador e o prazo de validade do seguro, que nunca será inferior a um ano.

Ora, sendo uma obrigação legal a realização do seguro de acidentes de trabalho por parte do prestador de serviços, a entidade beneficiária poderá exigir desses mesmos prestadores prova da sua existência, sob pena de se recusar a receber o serviço prestado enquanto tal apresentação não suceder, podendo inclusivamente levar à resolução do contrato de prestação de serviços.

Mas sendo o contrato existente caracterizado, judicialmente, como sendo de trabalho e não de prestação de serviços a resolução do contrato não terá qualquer fundamento uma vez que a obrigação da realização do contrato de seguro pertenceria ao empregador. Acrescerá ainda que essa resolução “transformar-se-á” numa declaração de despedimento, que não sendo precedida de procedimento disciplinar será sempre ilícita e portanto fonte originária de indemnizações e vários outros créditos decorrentes da cessação do contrato de trabalho.

Bastará para tanto que se prove que o trabalhador não trabalhava o tempo que queria, nem executava o serviço como lhe convinha, mostrando-se a sua actividade profissional condicionada às determinações da entidade que o contratou (ou…). Não se podendo portanto afirmar, que esse trabalhador é um trabalhador autónomo, em regime de prestação de serviços, mas antes um trabalhador juridicamente subordinado. (Acórdão da Relação do Porto no proc.9230085 in www.dgsi.pt).

E veja-se que o nome atribuído ao contrato não lhe altera a natureza jurídica de contrato de trabalho se nele se reunirem os seus requisitos típicos: prestação de uma actividade, subordinação económica e subordinação jurídica, como acima explicitado em A).

Haverá também a hipótese de denunciar o facto à entidade responsável pela fiscalização destas situações (IDICT), mas tal também poderá trazer consequências indesejáveis, caso o IDICT considere existir um contrato de trabalho. Aí, exigirá à entidade comunicação desta ao prestador que entre eles existe um contrato de trabalho pelas razões já sobejamente descritas. 

É assim de especial importância que qualquer empresa que contrate alguém em regime de prestação de serviços exija cópia da apólice de seguros e disso faça depender a execução do contrato ab initio.

C) Das consequências do acidente de trabalho

Importa primeiro definir o conceito de acidente de trabalho.

É acidente de trabalho, aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho, produzindo lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho, ou de ganho, ou a morte. Considera-se também acidente de trabalho, o ocorrido:
 
1. No trajecto, normalmente utilizado e durante o período ininterrupto habitualmente gasto, de ida e de regresso entre:
a) O local de residência e o local de trabalho;
b) O local de trabalho e o de refeição;
c) O local onde, por determinação da entidade empregadora, o trabalhador presta qualquer serviço relacionado com o seu trabalho e as instalações que constituem o seu local de trabalho habitual;

2. Quando o trajecto normal tenha sofrido interrupções ou desvios determinados pela satisfação de necessidades atendíveis do trabalhador, bem como por motivo de força maior ou caso fortuito;
 
3. No local de trabalho, quando no exercício do direito de reunião ou de actividade de representação dos trabalhadores;

4. Fora do local ou tempo de trabalho, na execução de serviços determinados ou consentidos pela entidade empregadora;
 
5. Na execução de serviços espontaneamente prestados e de que possa resultar proveito económico para a entidade empregadora;
 
6. No local de trabalho, quando em frequência de curso de formação profissional ou, fora, quando exista autorização da entidade empregadora;
 
7. Durante a procura de emprego nos casos de trabalhadores com processo de cessação de contrato de trabalho em curso;
 
8. No local de pagamento da retribuição;
 
9. No local onde deva ser prestada qualquer forma de assistência ou tratamento decorrente de acidente de trabalho.


C1 – Procedimento

Ocorrendo um acidente de trabalho, tal deverá ser comunicado à companhia de seguros para a qual foi transferida a responsabilidade civil. Caso não exista companhia de seguros ou esta decline a sua responsabilidade a participação será feita ao Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho competente para início do processo administrativo correspondente.

Em tentativa de conciliação, marcada para o efeito, tentar-se-á o acordo sobre diversos items. Em caso negativo haverá julgamento, dependendo do(s) item(ns) em desacordo.

As indemnizações (prestações anuais) a pagar são calculadas com base em todas as retribuições que o sinistrado auferir à data do acidente, uma vez que está em causa a perda da capacidade de ganho.

Para tal será fixada uma incapacidade permanente parcial (ou absoluta em casos mais graves: morte, paralisia total) e calculada com a idade do sinistrado e taxa de juro correspondente. Poderão tais prestações ser remíveis por obrigatoriedade legal.
Além destas prestações há também lugar ao pagamento de variadas despesas como de transporte para juntas médicas e tribunal, despesas de funeral (se for o caso),…

Fundamentação legal: Código do Trabalho (Lei 99/2003 de 27 de Agosto), Regulamentação do Código do Trabalho (Lei 35/2004 de 29 de Julho), Lei 100/97 de 13 de Setembro (considerações), Decreto-Lei 155/99 de 11 de Maio (considerações). 

Esta é, salvo melhor, a nossa opinião.